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Caaddss
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Por que decidi contar que sou TDAH já na entrevista, e por que não fiz isso em todos os processos seletivos que participei?

A decisão de mudar de emprego não é algo tão fácil e simples de se fazer. Por mais que o mercado esteja super aquecido para as pessoas desenvolvedoras, quando se faz parte de alguma minoria você acaba calculando mais seus passos para um tipo de mudança assim. São diversos riscos como: adaptação, respeito à diversidade, a busca por um lugar seguro para ser o que se é, fora todas as outras variáveis como salário e plano de carreira.

Esse ano foi muito conturbado e eu percebi que eu precisava de uma mudança. Comecei a me sentir estagnada, já não me sentia desafiada no dia a dia. Isso começou a se tornar um problema quando avaliando, eu percebi que estava em um platô. Então começa aquela rotina chata de entrevistas, testes, dinâmicas (sim, dinâmicas) e feedbacks (quando temos sorte de receber).

Se você me acompanha há algum tempo, sabe que eu sou TDAH e que falo sobre isso abertamente, tanto das 'vantagens' como também das dificuldades que tenho diariamente na minha rotina. E é ai que estava a grande questão que me assombrou por meses: "Como vou tratar sobre isso em um novo lugar?"
Eu descobri sobre o TDAH no meu antigo trabalho, meus colegas não só sabiam disso como também me ajudaram com adaptações para uma rotina que fosse produtiva para todos nós. Isso nunca foi um problema para o time, e eles acompanharam antes de começar o tratamento e depois, ou seja, eles puderam observar o aumento da produtividade com as novas medidas.

Como então chegar em um lugar novo e falar isso? O medo me paralisou por meses antes de realmente me engajar em buscar um novo lugar. Meu primeiro pensamento foi: "Darei meu jeito sem falar nada, e depois eu conto quando passar um tempo"

De entrevista em entrevista, de teste em teste, alguns extremamente chatos que já me deram desgosto só de tentar. Se meu dia a dia seria daquele jeito era melhor nem entrar. Claro que eu já estou aqui falando só de empresas comprometidas com diversidade, e que não acham que é nivelar por baixo.

Em todas as entrevistas, eu nunca senti abertura para falar sobre as minhas expectativas, ou até mesmo um certo conforto em estar no ambiente. O que eu quero dizer com isso? Na maioria parecia que as pessoas estavam só escutando para dar respostas padrão, mas não ouvindo para entender e continuar a conversa. Isso já acaba causando um desconforto, principalmente se você é hiperativo e fica com certo receio que percebam isso por causa da sua tendência a interromper pessoas e/ou ter brancos gigantescos. Fora que você percebe porque as respostas não soam coerentes ao que você disse.

Agora vou contar sobre o meu processo seletivo no Pagar-me:

Antes algumas considerações:
1) Sim, eu vou trabalhar lá.
2) Estou escrevendo ANTES de começar lá pra ninguém falar que houve influência.
3) Sim, eu tive a opção de escolher ir pra outro lugar mas não fui então não é pra puxar saco.

Voltando ao que eu estava falando, em quase todas as etapas tinha ao menos uma mulher participando da conversa, o que é muito legal e acaba te deixando mais confortável. Outra coisa muito bacana é o fato de não rolar aquilo que eu falei lá em cima. Já na primeira entrevista técnica houve uma interação muito legal, eu pude explicar a vivência em um case que eu tive, dificuldades, aprendizados. Tudo virou uma conversa muito espontânea. Parecia que eu estava conversando em um evento com pessoas da área, sabe? Tirou toda aquela pressão de ser entrevista e tal.

Vamos falar sobre o teste:
Bem documentado, bem escrito, e que não deixava margens para interpretações dúbias. Informações importantes destacadas com outra cor, uma maravilha pra todo TDAH, pois já chama a sua atenção pro ponto certo.

Agora, a apresentação do case, que foi efetivamente onde eu contei que sou TDAH.

Com certeza uma das coisas que eu mais tenho dificuldade na vida é colocar meu pensamento difuso em uma formato que faça sentido para outras pessoas, especialmente sabendo que estou sendo avaliada. É muito diferente, por exemplo, de uma palestra ou uma live. Era uma dificuldade a mais.

Obs: Estávamos perto da BF, e essa etapa era a mais longa do processo.

Em nenhum momento me apressaram, mesmo quando eu tive um branco monstro (aqui eu já tinha contado que sou TDAH). A primeira coisa que falaram foi para que ficasse calma, e mesmo quando faziam perguntas elas vinham acompanhadas de uma explicação, então eu conseguia entender a linha de raciocínio por trás e me posicionar ficava mais fácil.

Ai eu disse:

Olha, estou me sentindo em um ambiente seguro, então eu vou falar, eu tenho déficit de atenção, posso pedir só pra vocês não encadearem mais de uma pergunta na mesma fala, para que eu não me perca?
E NÃO MUDOU A EXPRESSÃO DELES, sim. Foi como se eu tivesse falado que iria beber água.

Mas a postura sim. Imediatamente, começaram a quebrar os blocos de perguntas e falas mais longas, e isso me ajudou demais. Não me aceleravam nos brancos que tive, assim eu pude demonstrar meu conhecimento com mais calma.

Já na outra etapa, eu pude também comentar sobre adaptações na rotina. Foi super aceito de braços abertos e, principalmente abraçado da seguinte forma: Eu não sei muito bem o que é, mas eu quero aprender, e vamos nos ajudando. (confesso que eu fiquei com vontade de chorar nessa hora porque foi muito fofo)

Então, quando eu tive que escolher pelas ofertas semelhantes, esse foi o grande critério de desempate. Eu ainda não iniciei minha rotina com eles, mas eu sei que vou ser acolhida, que vou ser bem tratada, e que vou poder construir uma história muito bonita com esse time, e sabe por quê? Pois isso começou já no primeiro contato.

Então aqui vão algumas dicas e pensamentos:
1) O nosso TDAH não some só porque não falamos nele. Então, é importante estar em um lugar que saiba aceitar que você tem uma dificuldade a mais, e está tudo bem!!!
2) Observe a postura das pessoas, a atenção que ela está dando para você, seja criterioso quanto a isso. Até porque seus dias serão mais compartilhados com eles do que com a sua própria família.
3) O medo de não ser aceito é paralisante, eu sei. MAS as vezes é melhor já cortar o mal pela raiz. Se você ser TDAH já é um problema na entrevista, o que garante que a sua vida não vai ser um inferno no dia a dia? E isso vale para qualquer coisa que afete o tua rotina: Depressão, Border, Ansiedade, e etc. Se você não sente seguro só vai piorar as suas características que já te causam dificuldades.
4) Somos incríveis e competentes apesar das nossas características.

Bom, por hoje é isso, espero que te ajude de alguma forma. Pode deixar que vou contando aqui como estiver sendo a minha jornada!!

Top comments (1)

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Vinícius Neto

Tenho TDAH tbm e achei muito interessante seu artigo. Só porque a pessoa tem TDAH não justifica que será algo improdutivo, pelo contrário, a abordagem para tratar isso seria como vc falou, quebrar em blocos as falas, até na discussão de resolver um problema atual, se a parada for bem explicada por partes, isso torna muito produtivo, tanto pro TDAH quanto pro restante do time, coisas bem explicadas e quebradas em partes deveriam ser abordagens comuns até para quem não tem TDAH.