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Henrique Lobo Weissmann (Kico)
Henrique Lobo Weissmann (Kico)

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Como aproveitar ao máximo um palestrante

Texto escrito em 2015
Então você está assistindo a uma apresentação em um evento ou um consultor está na sua empresa mostrando algo que pode tornar sua vida melhor. Terminada a palestra, em uma conversa entre colegas você critica o conteúdo ministrado e obtém como resposta algo como o clássico "quem é você para criticar fulano?".

Ou então algo ainda mais interessante: a apresentação lhe deu um novo ânimo pois agora sabe que seus problemas acabaram! Você quer aplicar aquele conteúdo em sua vida e no dia seguinte começa a luta. Tudo nos primeiros momentos vai maravilhosamente bem, mas logo você nota que as rosas que lhe venderam possuem mais espinhos do que lhe contaram.

Sou consultor e de vez em quando palestro em eventos ou empresas. Como consultor estou cansado de ver pessoas tendo prejuízos monstruosos devido a algo que foi mal compreendido ou dito em uma apresentação. Como palestrante sempre temo que o que digo gere muito prejuízo a quem me ouviu falar (e creio que todos os palestrantes deveriam ter esta preocupação).

Neste post lhe darei algumas dicas para não cair nestas armadilhas. Como tirar máximo proveito do palestrante, aquela pessoa que aparenta ser tão mais carismática que nós?

Termos fundamentais

Este post gira em torno de dois conceitos que considero fundamentais quando vou avaliar qualquer palestra.

Responsabilidade e irresponsabilidade

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Simples e direto: responsável é aquele que será procurado após suas ações serem executadas, tendo estas sido bem sucedidas ou não. Já o irresponsável executa suas tarefas e parte.

Na esmagadora maioria das vezes o palestrante expõe o tópico e sai. Ele irá embora, mas a impressão permanece nos ouvintes. O expectador é o maior responsável pelo que faz com o conhecimento transmitido.

Arrogância

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No livro "Direita e Esquerda", Norberto Bobbio dá a melhor definição do conceito que conheço: é "a confiança excessiva nas próprias habilidades".

Eu e você já fomos arrogantes ao menos uma vez. Um esforço honesto de memória nos exporá situações nas quais realmente acreditávamos conhecer um assunto e transparecemos isto a alguém, para depois descobrirmos que não eramos tão bons assim naquilo.

Quem está falando?

who_is_talkingA pessoa é mais que um nome, e a pesquisa a respeito do passado do palestrante é um excelente detector de arrogância. Tudo bem que existem exceções, mas como levar a sério alguém que se apresenta para falar de um assunto, por exemplo, desenvolvimento de software e se apresenta assim?

Fulano Simpático é profundo conhecedor do assunto X e possuí três anos de experiência como desenvolvedor

Você busca o currículo da pessoa e descobre que destes três anos, um foi como estagiário, dois em apenas uma empresa e que o assunto X tem pelo menos 15 anos de existência. Se a apresentação for algo como a exposição da sua experiência, talvez seja interessantíssimo: é fascinante ver as dificuldades enfrentadas por iniciantes, mas se for uma aula detalhada sobre o assunto... desconfie: a genialidade infelizmente não é um artigo popular no Universo.

Havendo tempo, uma busca rápida pelo LinkedIn, blog, artigos publicados ou coisa similar já expõe bem a natureza do palestrante. Este é o primeiro passo: detecte a possível arrogância do sujeito. (redes sociais como Facebook não contam: é lugar de se postar trolagem (o meu pelo menos é)).

Experiência não é tudo: o mínimo de consistência também é importante. Se um dia a pessoa fala sobre X, em outro sobre Y, depois sobre Z, A, D, H, E, J  e os assuntos são distantes uns do outros, vejo algumas opções:

  • Estou diante de um especialista em porra nenhuma
  • É alguém que curte novidades e divulgá-las (e isto é positivo, desde que não se venda como profundo conhecedor dos assuntos tratados)
  • Dificilmente a pessoa teve tempo para trabalhar efetivamente com os assuntos tratados na prática

Mas conhecer melhor o passado do palestrante te traz outra vantagem: te ajuda a fazer melhores perguntas. Entenda: ninguém conhece a totalidade de um assunto, pois todo conhecimento é definido pelo contexto em que o sujeito se encontra. Se você me perguntar como se deve aplicar Groovy e Grails no processamento de Urânio não vou saber te responder.

E sabe qual a vantagem de boas perguntas? Elas te dão um monte de conteúdo. 

E o lado feio?

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Você vê a solução e ela parece linda. Mas não tem nenhum porém, nenhum lado feio, nenhuma limitação??? Na minha opinião esta é a pergunta mais importante: quanto custa?

Nos últimos anos a ausência desta pergunta gerou prejuízos imensos que pude ver em primeira mão. Seguem dois exemplos:

  • Equipes que abandonaram completamente o modelo relacional e abraçaram alguma solução NoSQL, como MongoDB, para depois perceberem que coisas "bobas" como integridade referencial não são algo "careta e ultrapassado".
  • Empresas que realmente acreditaram que seria possível reduzir a complexidade dos seus sistemas adotando micro-serviços que se pegam em uma situação BEM pior que a anterior por que não se falou muito a respeito dos custos envolvidos.

Quando o palestrante não fala muito a respeito dos trade-offs, isto não quer dizer que a pessoa é má intencionada: está apenas apresentando seu aspecto irresponsável e talvez arrogante. Terminada a apresentação, a bola está com você.

Normalmente a pessoa está tão enamorada pelo assunto apresentado que não consegue ver suas limitações: qualquer um que já tenha se apaixonado sabe do que estou falando.

(dica: se o palestrante tem um slide mostrando os custos da tecnologia e o expõe rapidamente, peça para que fale mais a respeito do assunto ;) )

Desconfie do carisma/"atitude"

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Já reparou que na natureza as coisas muito coloridas (como a flor acima) normalmente são armadilhas? Numa palestra o que realmente interessa é o conteúdo, mas há aqueles palestrantes que são simplesmente excessivamente carismáticos.

São pessoas divertidas, simpáticas, engraçadas, bem articuladas. Ou então podem possuir aquela postura mais radical, quase agressiva. Aquele sujeito "adoravelmente desagradável" que conquista a sua simpatia. É difícil vencer esta tentação. Todo mundo quer ser como aquela pessoa, e se ela diz algo, deve ser o correto, certo? Certo?

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Minha dica? Dou tempo ao tempo. Tento resistir ao carisma e prestar atenção no conteúdo. Espero passar um mês e tento me lembrar do conteúdo. O que mais me impressionou? O palestrante ou o conteúdo?

(nos meus 36 anos fica claro para mim que a maior parte das pessoas que me influenciaram eram na realidade tolos carismáticos (e esta descoberta não foi decepcionante, mas sim um alívio))

Pergunte (não precisa ser na hora)

Eu sei que fazer uma pergunta em público pode dar uma vergonha danada. Talvez você fique com medo de dizer alguma bobagem na frente de todos e isto muitas vezes te cala. Mas quem disse que a pergunta precisa ser feita durante a palestra?

Todo palestrante expõe seus dados de contato. Se acha que não é interessante perguntar naquele momento, faça como eu: anote todas as suas dúvidas e em seguida lhe envie um e-mail. Nunca encontrei alguém que não me respondesse, por mais importante que fosse.

Estude antes da apresentação

Quando vou a uma palestra que realmente me interessa costumo estudar um pouco sobre o assunto antes do evento. Isto me ajuda bastante a fazer melhores perguntas e na compreensão do que vai ser exposto.

Não precisa ser um estudo profundo: muitas vezes uma leitura de 20 minutos antes do evento já é suficiente pra te contextualizar.

Peça pelas fontes

Dificilmente todo o conteúdo apresentado foi criado pelo palestrante. Pra tirar máximo proveito do que foi exposto sempre peça as fontes usadas na apresentação. Muitas vezes o que mais aproveito em uma palestra é justamente a bibliografia!

É uma oportunidade excelente de entrar em contato com textos que dificilmente você ouviria a respeito se não tivesse participado do evento. Se o autor não expor suas fontes, apenas pergunte por alguma sugestão de leitura.

Lembre que a bibliografia nem sempre é explícita, mas sempre está presente. Basta prestar atenção nos nomes citados durante a palestra.

Existe mais de uma realidade

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Conhecer o passado do palestrante traz outra vantagem: você passa a entender sua realidade, que sempre é distinta da sua, e este é um ponto importantíssimo.

Muitas vezes o palestrante é criticado por que o ouvinte não consegue por em prática aquilo que foi exposto. Uma razão comum (quando bobagens não foram ditas) é o fato de estarem em realidades diferentes. Exemplo clássico: alguém que trabalhe em uma empresa gigantesca falando sobre sua infraestrutura de servidores. É uma realidade restrita, dado que a esmagadora maioria dos ouvintes comemora e muito se tiver mais de um (mesmo com a cloud).

Então para tirar máximo proveito do que foi exposto é fundamental a contextualização. O que está sendo apresentado funciona (ou não) dentro do contexto do palestrante. É sua responsabilidade portanto, se quiser aplicar o que viu, adaptar (se possível) o que foi exposto para a sua realidade.

Seja crítico e valorize suas próprias experiências

Não é raro estar em uma palestra e presenciar o palestrante desdenhar um conjunto de conhecimentos que fazem parte do seu dia a dia. Neste momento você deve se fazer o seguinte questionamento: se é tão ruim assim, por que têm funcionado para nós?

Esta é uma pergunta importantíssima. Já cansei de ver o clássico momento "Java sucks, use X que é melhor". Se não for apresentada uma excelente justificativa para a troca, pulo fora na hora.

Não estou dizendo para você ser um reacionário: apenas para não desvalorizar os conhecimentos que já tem. Não é o fato do outro estar com o microfone na mão que o torna o dono da verdade.

Concluindo

Palestras e eventos são uma fonte praticamente infinita de riqueza intelectual quando bem aproveitados e de prejuízos imensuráveis se o ouvinte não adotar uma postura ativa, questionadora e crítica.

Ter uma postura crítica diante de uma apresentação não deve ser visto como uma postura negativa, mas sim como a tentativa de se extrair o máximo possível de eventos cuja finalidade é nos formar.

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